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terça-feira, 7 de junho de 2011

Com as provas de ingresso nas escolas, crianças aprendem cedo o que é concorrência

Uma brincadeira de colocar grãos — milho, arroz, feijão — dentro de garrafas. A atividade foi proposta a João Cláudio, então com 6 anos, como parte de um processo de avaliação para ingressar no Colégio Santo Agostinho, na Zona Oeste do Rio, em 2009. Depois de cumprir a tarefa, o menino pegou uma das garrafas para brincar, usando o recipiente como um chocalho. Sua mãe, a advogada Flávia Braga, atribui ao “impulso” o fato de João Cláudio não ter sido aprovado para a escola. — Não imaginava que era tão concorrido. Ele achou que era o único a não passar, mas expliquei que isso acontece com muitas crianças. Acho que o colégio busca pessoas mais organizadas. E, se não fizer isso, como vai selecionar? — indaga Flávia. A pergunta da mãe de João Cláudio é repetida por coordenadores de escolas que adotam avaliações para entrada de crianças quando há mais candidatos que vagas, os chamados vestibulinhos. As provas, ou vivências, como preferem chamar alguns colégios, são alvo de polêmica que envolve educadores, pais e Justiça.
 E passa pelo questionamento da legalidade da prática. CNE é contra concursos Três pareceres do Conselho Nacional de Educação (CNE) recomendam a proibição das avaliações para acesso ao fundamental. Eles se baseiam no artigo 31 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. “A avaliação jamais deverá ser utilizada de maneira punitiva contra as crianças, não se admitindo a reprovação ou os ‘vestibulinhos’ para o acesso à educação infantil e à primeira série do ensino fundamental”, diz trecho de documento de 2007. As recomendações foram homologadas pelo Ministério da Educação. Em 2007, as avaliações motivaram uma ação do Ministério Público Federal em São Paulo, que teve como réus três tradicionais escolas — Nossa Senhora das Graças, Porto Seguro e Santa Cruz —, além do estado de São Paulo e a União Federal. Para a procuradora Eugênia Gonzaga, autora da ação, há ilegalidade também nas provas para o 6 ano. — A criança tem direito ao fundamental inteiro. Para mim, essas escolas estão na ilegalidade. Mesmo essas manhãs de vivência geram dano psicológico na criança — defende a procuradora, que classifica o vestibulinho como um “método eugenésico de seleção” e defende “critérios objetivos” como sorteio, ordem de inscrição e prioridade para quem já tem irmãos matriculados na escola. Parte desses critérios é adotada pelo Colégio Vértice, em São Paulo, o mais bem colocado no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2009. São feitas ainda entrevistas e avaliação do material usado pelo aluno. Um dos diretores da escola, Adilson Garcia, diz que os procedimentos não são classificatórios: — Não acreditamos no vestibulinho, não nos interessa trabalhar só com uma elite intelectual. Muitas vezes o que interessa é a boa vontade do aluno. No CAp-Uerj, no Rio, que, ao lado do Pedro II e do Colégio Militar, está entre as escolas públicas mais concorridas do estado, o sorteio é usado para o ingresso no 1º ano do ensino fundamental. Os candidatos ao 6º ano fazem uma avaliação de Português e Matemática. A relação de candidatos por vaga é de cem para uma. — No 6º ano, como já cursou séries anteriores, o aluno tem de estar preparado — diz a coordenadora pedagógica do colégio, Vânia Moreira. — A prova é bastante adequada ao nível cognitivo da idade. E, em geral, os alunos se preparam com cursos. Um desses preparatórios é o Colégio e Curso Desafio, no Rio. No ano passado, um de seus alunos ficou em primeiro lugar geral no concurso de admissão ao 6 ano do Colégio Militar. — As provas são muito difíceis, mas concurso é mais democrático que sorteio porque premia quem se preparou — avalia a diretora e coordenadora do preparatório de admissão ao 6 ano, Márcia Mattos. As provas normalmente ocorrem em outubro, mas cerca de 30 crianças estão matriculadas nas aulas extras de Matemática e Português, que ocorrem no turno oposto às aulas convencionais, duas vezes por semana. Ao ser perguntada se ficará nervosa no momento da avaliação, Ananda Justino, de 10 anos, responde de bate-pronto: — Sim. Fiz a prova no ano passado e não passei. Vinha de uma escola mais fraca e não estava com uma base boa. — Eu também fico bem nervoso — completa Humberto Almeida, de 11 anos. A pedagoga Bertha do Valle, da Faculdade de Educação da Uerj, diz que os pais precisam estar preparados para lidar com a criança que será submetida a um desses testes. — O clima da família é a coisa mais importante. Os pais devem mostrar que, passando ou não naquela prova, o filho continuará sendo amado. Se a família ficar cobrando, a tendência é não querer estudar.


Créditos: http://extra.globo.com/noticias/educacao/com-as-provas-de-ingresso-nas-escolas-criancas-aprendem-cedo-que-concorrencia-1965645.html

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